diciembre-enero 2023, AÑO 22, Nº 90

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Diário de Viagem
Um tradutor no Baixio dos Francos
Campeche, outono 2018 (na ilha): Oh, pedaço de mim

A chama trêmula destacou
de repente o rosto fundo e
enrugado do tuberculoso, com os
olhos muitos abertos à flor da pele.
Lúcio Cardoso, Salgueiro

 

Para me recuperar de mim, como
para esquecer-me temporariamente,
procurei abrigo em algum lugar (...)
que outra coisa fizeram sempre
os poetas? Para que serve
toda a arte que há no mundo?

Nietzsche

 

Como si el confesional no
fuese en ocasiones un ejercicio
de apertura a lo desconocido que
transforma el yo en direcciones
imprevisibles

Alberto Giordano

 

 

Diário completo – Me exilo no Diário de Lúcio Cardoso. Há anos vinha adiando essa leitura, também a Crônica da Casa Assassinada, Salgueiro, Maleita, etc. Nascido em Curvelo, Minas Gerais, Lúcio fez de tudo um pouco: escreveu romances, poemas, peças de teatro, roteiros de filmes (e dirigiu também), pintou – quando um derrame o deixou meio paralisado em 1962: “Hoje, procurando alguns locais que ainda me faltam para A mulher de longe, achei-me no alto de uma encosta que descia bruscamente para o mar, em torrentes, grutas e socavões de terra vermelha, num colorido tão belo e violento que quase parecia artificial”. O Diário traz no começo o ano de 1949. Quatro anos antes, no dia 4 de fevereiro, meu avô José se matava. O pêndulo da história havia oscilado para a democracia burguesa após anos de ditadura.

 

*

Serenô da madrugada – Salgueiro é o nome do Morro na Tijuca que abriga a tradicional escola de samba vermelha e branca, o Clube Recreativo Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro. Perto do morro, nos anos 40, morava a família de Jaime Praça, delegado “de Getúlio”, família a que iria me ligar em meados dos anos 70, quando conheci Jaiminho, depois seu irmão Marcelo – filhos de Vitinho e Gueldi –, e a prima, Renata (filha de Murilo e Nelly), a quem me uniria em 1986 e que daria Clara à luz, em 1987. Eu era um menino do Leblon, onde morava também outro pedaço da família Praça: os primos Guilherme, Rodolfo e Magda. Da Tijuca ao Leblon, o trajeto de uma geografia dos afetos. Vem chegando a madrugada oi / o sereno vem caindo / cai, cai, sereno devagar / que meu amor está dormindo (samba de Zuzuca do Salgueiro e Noel Rosa de Oliveira, 1966, sucesso nas vozes de Jair Rodrigues e Elizeth Cardoso).

 

*

Rosas, rosas, rosas – Mil novecentos e 64, ano em que o pêndulo oscila de volta para a ditadura que iria durar longos 20 anos, Caymmi visita Tom. Na voz de Nana, o veludo e o luxo da voz paterna (Sem você). Tom canta com Dorival Saudades da Bahia, fazendo contracanto. Eu tinha nove anos e iria virar gente durante a longa noite desses anos de sufoco. Passarim anuncia em 1984 um novo movimento do pêndulo. Esperanças renovadas, desilusões reconfirmadas. Se eu me chamasse Raimundo... o mundo é bem maior que meu coração.

 

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El agorero yajá – Me exilo e desenho no ar uma política das amizades: yajá, chauna torquata, criatura desengonçada e encoleirada, nhuma-poca, chajá, anhuma-do-pantanal, tarrã e tachã-do-sul. Encontro-o, por acaso, nos versos de La cautiva e buscando conhecê-lo melhor fico sabendo que é um gritador (como a aracuã, quando o dia nasce e quando o dia decai), um corneteiro: No; de la quieta llanura / ya se remonta a la altura / gritando el yajá. Há outros pássaros no poema: el águila, el cuervo, la cigüeña, el carancho (nosso carcará, polyborus plancus). Anhuma tem no Pantanal, mas yajá é ave do Pampa onde também encontrei acolhimento deixando escorrer por meu corpo, do ânus divino, a neve quente do afeto argentino.

 

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Com o aprendiz de ternuras – Tom me leva pela mão no Urubuquaquá, no Pinhém, pra ver Jereba e diz: Vou fazer minha casa / Na asa do urubu peba / Que casa só é segura / Feita em asa de Jereba. Urubu é também o nome do décimo disco de Tom, lançado em 1976. Caranguejo conversa com arraia (...) Papagaio discute com jandaia (...) Inhambu cantou lá na floresta (...) Camiranga urubu mestre do vento / urubu caçador mestre do ar. Ainda ontem vim do Urubuquaquá, do Pinhém. De mão com Tom e Rosa. Com vontade de ir por aí.

 

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Não sou eu quem me navega – Galo cantou às quatro da manhã / céu azulou, na linha do mar./ Vou m’embora deste mundo de ilusão / quem me vê sorrir, não há de me ver chorar

 

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Convalescere ex morbo – Atmosfera de abril/maio, inverno vencido, mas ainda próximo, vislumbre do verão, primavera, tempo de convalescência, de recobrar as forças. Nietzsche abre La Gaya Scienza falando da gratidão de um convalescente (die Dankbarkeit eines Genesenden), sendo a convalescência (die Genesung) o mais inesperado (dieses Unerwartetste). Da embriaguez da convalescência ao júbilo da força que retorna, mora na filosofia: qual o devir do pensamento sob a pressão da doença? O corpo doente do filósofo-que-sofre empurra, impele, atrai o espírito para o Sol macio, o sossego, a brandura, a paciência, o remédio, o bálsamo. O saber jubiloso, jovial, divertido, feliz e lépido, dança e vai tomando o lugar da pressão terrível e longa, desse pedaço de deserto, da exaustão, da descrença, do esfriamento. Dança em 2/4, no pulsar do surdo. Quente. Fröliche Wissenschaft.

 

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Une saison en Enfer –Sonho com o enfermeiro que me atende na Clínica de Urologia, um manezinho de coração grande, que faz tudo pra minimizar meu desconforto e me dá as informações que os médicos “esquecem”. Ele tira a sonda e meu xixi salta num jato, desenhando uma curva no ar e caindo no chão do consultório. Há duas semanas fui operado. Há duas semanas a bexiga não tem autonomia.

 

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O filme, a trilha – Em 1971, Paulo César Saraceni filma Crônica da Casa Assassinada, de Lúcio Cardoso, com Norma Bengell no papel de Nina, Nelson Dantas e Carlos Kroeber como os dois irmãos Meneses, e música de Antonio Carlos Jobim. A Suíte da Crônica da Casa Assassinada iria depois compor o maravilhoso LP Matita Perê (1973), que trazia além da música título inspirada por Guimarães Rosa (O duelo, de Sagarana), Águas de Março e Mantiqueira Range, de seu filho Paulo. Disco dedicado a Rosa, a Drummond e a Mário Palmério. Não sei porque mas associo Lúcio Cardoso a Nelson Rodrigues. Tá bom, Lúcio é mineiro da região mítica de Guimarães Rosa, porém algo os aproxima, talvez Dostoiévski. Melhor ainda foi ver Lúcio e Tom unidos em plena noite dessa ditadura conduzida então por um de seus piores generais, Emílio Garrastazu Médici, um gaúcho de Bagé, filho de um imigrante italiano com uma uruguaia de origem basca. Nesta época, começo a me dar conta da vastidão do mundo. E do AI-5.

 

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O urubu e a América – Plano para uma teoria do urubu que tente percorrer alguns contornos da América, essa nossa, a Latina, e aquela outra que desperta em mim sentimentos tão contraditórios. Pássaro de polêmica classificação – e a taxonomia foi durante muitos anos a obsessão da zoologia – , pertence à família dos cathartidae, palavra derivada de katharós, limpo, de katharévo, estar limpo, ser puro, de kathaíro, purificar, lavar, limpar, de katharmós, purificação por um sacrifício expiatório e kátharma, objeto empregado nas purificações que representa simbolicamente a mancha do que se queria purificar, mas também indica o primeiro grau de iniciação nos mistérios de Elêusis. Nosso urubu só tem na América, seu território. Alimenta-se de cadáveres. É o pássaro da purificação. É preto. Jereba, nome tupi, assim como urubu. É amigo de Tom.

 

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Primeira guitarra – Morávamos em Campo Grande, Mato Grosso, e eu voltava do colégio Dom Bosco no ônibus da base como todos os dias. Este, porém, era um dia especial. O ônibus parou ainda no centro e meu pai me chamou. Dali, fomos para a loja de música onde ganhei uma guitarra (tocava violão desde os 10,11). Era 1967 ou 1968, meu mundo era a família, as montanhas e o mar no Rio e aquela terra vermelha, plana, a que eu voltaria apenas no início dos anos 80, a caminho da Bolívia e do Peru. A guitarra era simples, uma strato nacional, não lembro a marca, branca e vermelha. Nós tínhamos um conjunto, tocávamos em festas, nos festivais e éramos ensaiados pelo grupo profissional de um dos clubes da cidade. A gente dizia conjunto e não banda (sempre associada aos grupos de sopro), galera era um barco (aprendíamos na escola), balada o nome de uma loja de sucos e rock’n’roll se misturava com Jovem Guarda, iê-iê-iê. Quando voltamos ao Rio, a favela Praia do Pinto tinha sido consumida por um incêndio (certamente criminoso; devagarinho o Leblon começava sua gentrification, consumada quando se torna personagem de novela já nos anos 80). E eu nem sabia do AI-5.

 

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Brincadeira animal – Leio fascinado o livro de Brian Massumi que nos inclui no continuum animal através do conceito de brincadeira: dois lobinhos brincam de lutar, simulam uma situação necessária no futuro, a luta, transmutando-a pela diferença em outra coisa (essa mordida não é exatamente uma mordida, estamos brincando), mergulhando-a no campo do condicional, das possibilidades. Corrige ainda a noção de instinto que abarca assim a criatividade, a atividade estética irredutível aos modos funcionais. Instinto não é pura repetição, estímulo-resposta, reflexo, mas expressividade improvisacional. Improvisação que responde sempre com a diferença. Muita gente trabalhando nesta direção. Vale voltar a A comunidade dos espectros, de Fabián Ludueña Romandini.

 

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Die Hoffnung – O dia amanheceu com uma chuva fina, mas agora o sol saiu e o vento vai limpando do céu um resto de nuvens.

 

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De terno preto – O urubu-de-cabeça-preta, coragyps atratus, é o mais comum no Brasil, o de menor envergadura (1,48m) entre os urubus (o de cabeça amarela, o de cabeça vermelha – esse o Jereba, o Peba, o Camiranga, o Perutinga, o preferido de Tom, cathartes aura – , o da mata), aquele que a gente encontra em qualquer lugar. Via-o no Rio, desde criança, dividindo com os porcos os restos nos montes de lixo da Praia do Pinto, e o vejo também aqui na Ilha, por vezes pousado no alto dos postes de asas abertas. Para compensar o olfato não muito desenvolvido, o coragyps tem uma visão de longo alcance para detectar a carniça mesmo quando voa muito alto aproveitando as correntes de ar quente para economizar energia. Seu nome significa corvo abutre vestido de luto. Tem a cabeça e o pescoço nus e não fica doente, apesar de comer carne podre.

 

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Lamento – A insensatez / que você fez / coração mais sem cuidado

 

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Epistolário – Novamente Nemesio Gamboa me ilumina: Minha mãe me chama / Comanche (bis) / Pois enquanto existir deus no céu / urubu não come folha / Enquanto existir deus no céu / eu vou cantando gente boa / Minha mãe me chama / Comanche

 

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Dom de Tom – Ouço os discos de Tom que não conhecia e tento organizar a experiência: separo Tide, 1970, The Adventures (trilha sonora para o filme, de 1970), Stone Flower, também de 1970, todos com arranjos de Eumir Deodato, ligados à Sinfonia da Alvorada, de 1961, e a Matita Perê, de 1973 – Tide, instrumental, mas mais chegado à forma canção; nos outros, a veia orquestral, Villa-Lobos, os impressionistas franceses, e menos o Tom das canções (ando apaixonado por Sem você, Foi à noite, Se é por falta de adeus). Mas também Urubu, de 1976, Passarim, 1987, meus discos pássaros, cheios de animais (a primeira música de Urubu chama-se Boto, a segunda Correnteza – Ô Dandá). Ah, e Tom e Elis, de 1974, simplesmente sensacional, enche o corpo de entusiasmo, como o solo do trombone em Thereza My Love (Stone Flower). Deslumbramento!

 

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Haydée conta – Ele já havia tentado antes, em 1943, por aí, morávamos no Flamengo. Ao lado, vivia um professor de piano que ainda tentou evitar que eu o visse saindo do apartamento de maca, me convidando pra entrar. Não quis. Da segunda vez, dois anos depois, eu estava com difteria; ele cuidou de mim, esperou que melhorasse e nos mandou pra Arcozelo. Tentou então de novo. E conseguiu. Quatro de fevereiro de 1945. Eu tinha 17 anos e sonhos de fazer Medicina.

 

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Teoria do urubu – Um tal exercício americano, continental, não poderia esquecer, e este seria seu teatro de operações, o lugar do Brasil – do Caribe, dos EUA, das Américas, em suma – no complexo escravagista atlântico e as plantations que possibilitaram a acumulação de capital no Ocidente (?) sob a sombra da mais ignóbil exploração, depredação e ocupação que se tem notícia: não há modernidade sem escravidão. “A fantasia do branco”, diz Achille Mbembe, “foi bem-sucedida nisso porque, por fim, se tornou a marca de um modo ocidental de estar no mundo, de uma determinada figuração da brutalidade e da crueldade, de uma forma singular da predação e de uma capacidade inigualada de sujeição e de exploração de povos estrangeiros”. A diferença do urubu, o macho branco cristão que invade as Américas enche a terra de cadáveres.

 

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Expectativa – Véspera de mais uma ida à Clínica de Urologia. Na und? Quase três semanas da operação.

 

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Inteligência animal – Descubro em El país, o único jornal “brasileiro” que consigo suportar, um texto de Emmanuelle Pouydebat, bióloga e pesquisadora do CNRS, falando da inteligência das aves – não apenas os primatas são inteligentes! Com vários exemplos, mostra como muitas aves, apesar de não terem polegar opositor, fazem uso criativo de ferramentas. Procuro na internet e encontro seu livro L’intelligence animale / Cervelle d’oiseaux et mémoires d’éléphant que, por sorte, está disponível em kindle em castelhano.

 

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Homem branco, urubu preto – “Aquilo que caía no chão depois do destripamento era rapidamente devorado por abutres escuros que formavam grupos sobre os telhados brancos das casas. Eram urubus-de-cabeça-preta (Rabengeier) – pássaros totalmente pretos que, como galinhas, saltitavam pelo chão onde inspecionavam os restos com seus bicos afiados”. (Jünger, A bordo, 7 de novembro de 1936, em Belém do Pará) “Um golpe único, entrando pelo baixo ventre. Um destripamento rápido...” (Euclides da Cunha, Os sertões, A degola)

 

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Dedicatória – Saio da Clínica às 8h30min sem sonda para mais um teste – devo fazer xixi em três ou quatro horas, senão outra vez a prótese invasiva. Caminho pelo centro, almoço com amigos, tento não pensar. Na noite anterior, havia sentido minhas entranhas se mexerem e meu corpo parecia dizer que estava voltando ao estado pré-operação. Às 14h, começo a pensar que ainda não será desta vez. Mas finalmente a coisa anda e a alegria se esprai junto com o primeiro jato de xixi. Ligo pra Clínica e falo com Valci, o enfermeiro manezinho que se tornou meu cúmplice, que cuidou de mim: “Dedico a você meu primeiro xixi”. Dankbarkeit (Gratidão)

 

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Tempos de pedra – Vou a Cabral e lá está, na Educação pela pedra, de 1966, o urubu mobilizado: Durante as secas do sertão, o urubu, / de urubu livre, passa a funcionário. / (...) cala os serviços prestados e diplomas, / (...) e vai acolitar os empreiteiros da seca, / veterano, mas ainda com zelos de novato: / aviando com eutanásia o morto incerto, / ele, que no civil quer o morto claro. / 2 Embora mobilizado, nesse urubu em ação / reponta logo o perfeito profissional. / No ar compenetrado, curvo e conselheiro, / no todo de guarda-chuva, na unção clerical, / com que age, embora em posto subalterno: / ele, um convicto profissional liberal.

 

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Oh pedaço de mim – Entrando na quarta semana. Ainda dói.

 

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Em Recado do morro – há uma página dedicada ao urubu. Quando os cinco encontram Gorgulho, “que nem casa tinha, vivia numa gruta, perto dos urubus, definito sozinho”. Na Lapa dos urubus, uma urubuquara, vivia esse que escuta o morro falar: “Amém que, urubu, de seu de si, não arruma perjuízo pr’a ninguém”. Mas Pedro Orósio e frei Sinfrão queriam saber mais dos urubus e vem então a narração de Gorgulho: “Assaz quase milhares. Que passam tempo em enormes voos por cima do mundo, como por cima de um deserto, porque só estão vendo o seu de-comer.(...) Tinha hora, subiam no ar, um chamava os outros, batiam asa, escureciam o recanto. Algum ficava quieto, descansando suas penas, o que costuravam em si, com agulha e linha preta, parecia. Careca – mesmo a cabeça e o pescoço são pardos.(...) Os urubus, sem chapéu, e dançam seu baile”.

 

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Corpo com órgãos – A bexiga é um reservatório musculo-membranoso cuja função é receber, dos rins, e reter a urina que será em algum momento eliminada por via da uretra. O sistema urinário é constituído por órgãos secretores e excretores, ditos uropoéticos, ou seja, que promovem a uropoese, a produção de urina (ουρον), uma poética, e uma política, dos restos líquidos. São eles: rins, ureteres, bexiga e uretra. Micção é a emissão natural de urina por esvaziamento da bexiga. Exame, 5 de abril: Bexiga com capacidade preservada, paredes finas e regulares, notando-se proeminência do lobo mediano, determinando abaulamento do soalho vesical. Vesículas seminais de morfologia, ecotextura, dimensões e topografia habituais. Não há sinal sonográfico de líquido livre, coleções ou massas intracavitárias. Lentamente, meu sistema se recupera; já não dói.

 

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Outono – O vento sul sopra um ventinho já mais pra frio mas o dia tá deslumbrante: céu azul, as árvores brilhando dos verdes puxados pela chuva anterior, o sol, como queria M.de A., macio. Em uma semana, estou na Alemanha.

 

(Actualización mayo – junio 2018/ BazarAmericano)




9 de julio 5769 - Mar del Plata - Buenos Aires
ISSN 2314-1646